quarta-feira, 13 de maio de 2020

TALVEZ UM BREVE ADEUS

Para a menina linda dos olhos castanhos

“Amo a liberdade, por isso deixo as coisas que amo livres. Se elas voltarem é porque as conquistei. Se não voltarem, é porque nunca as possuí.” Ela escreveu essa frase no meu caderno em 1984. Descobri, só hoje que é do John Lennon. Este é o último texto que estou escrevendo para ela e eu não sei como começar isso. Engraçado que, depois de tudo que já vi e vivi eu não tenha, ainda, conseguido aprender a superar a sua ausência. Convivemos por muito pouco tempo, eu sei. Mas, para mim, foi intenso. Recordo as conversas por horas a fio depois das aulas, os papos sobre a eternidade, sobre Deus, sobre Nietszche e o Eterno Retorno,  eu na sua casa tentando ensiná-la a tocar violão, nós ensaiando uma música para um festival na casa de meus amigos… Me lembro perfeitamente da nossa viagem para a Prainha, nós escalando o portão do apartamento que eu morava pois eu estava sem a chave do prédio (acabamos entrando pela janela da cozinha!), ela passando a noite no meu quarto, como amigos. Só agora posso ver como fui fraco ao não tentar lutar pela sua amizade quando éramos jovens. Somente hoje entendo, realmente, como essa menina era importante na minha vida. Eu gostei muito dessa menina. Além do que deveria, talvez. Mas eu não acreditei em mim mesmo e pensei que esse sentimento fosse passar um dia, pois eu precisava tocar minha vida sem sua companhia. Que era apenas um carinho e uma proximidade exagerada e ela tinha caminhos diferentes para seguir e, por isso, deixei ir (como ela ensinou…). Contudo, descobri com o tempo que, na realidade, esse sentimento fora uma pequena semente plantada no meu coração e que se transformaria em uma árvore imensa, tomaria meu corpo e invadiria meus pensamentos até não deixar espaço para que eu respirasse. Ela se tornou, com o tempo, a única razão da minha existência. Por esse motivo, por muitos anos vivi para procurar por ela e poder contar da saudade que eu sentia, da falta que ela fazia na minha vida, até que finalmente consegui encontrá-la depois de 34 anos. Mas eu não me dei conta que tempo demais havia se passado. O mundo mudou, a vida mudou, ela mudou. Hoje reconheço que ela estava certa quando me disse que me via preso no passado. Eu não mudei, realmente. Continuei acreditando naquele sentimento e esperando por sua amizade novamente. Agora, nem sei mais como dizer o que sinto desde que a menina me disse… não, na verdade ela não me disse nada. A menina dos olhos castanhos simplesmente se foi. E, novamente, perdi talvez a única amiga verdadeira que eu já tive. Quem sabe, no futuro, já velhinhos, a gente se encontre e eu consiga transformar o que estou sentindo agora, enxugar as lágrimas e rir deste tempo. Mas quero que a Menina linda dos olhos castanhos saiba que esperarei eternamente seu perdão e estarei aqui para ela sempre que ela precisar de um amigo. E, como ela mesma escreveu para mim, uma vez, "tu te tornas eternamente responsável por aquele que cativas..." E ela me cativou.